*Por Luciano Máximo | De São Paulo
Diversas organizações públicas já se preparam para protocolar hoje, ou nos
próximos dias, pedidos para a abertura de informações em todos os níveis de
governo, baseadas na Lei de Acesso à Informação que entra em vigor hoje. Os
pedidos em preparação envolvem os mais variados assuntos, do andamento real das
obras da Copa do Mundo em todas as cidades-sede às condições de saúde de presas
no sistema prisional paulista, passando por como são aplicados recursos do fundo
setorial da indústria para a inovação e uma lista de cada um dos proprietários
de títulos da dívida pública brasileira.
A Lei de Acesso à Informação (12.527), sancionada em novembro do ano passado,
entra em vigor hoje. Ela obriga o poder público em todas suas esferas -
municipal, estadual e federal - a fornecer informações solicitadas por cidadãos,
empresas e entidades da sociedade civil organizada. Para especialistas, trata-se
de um marco da organização do Estado brasileiro e um avanço democrático, além
contribuir para o controle social de governos e ajudar no planejamento e
decisões sobre negócios.
O Instituto Ethos, grupo que trabalha para promover a prática da
responsabilidade social no setor privado, participou de todos os momentos da
discussão e elaboração da nova legislação. O gerente-executivo da entidade, Caio
Luiz Carneiro Magri, informa que vai acionar as prefeituras das 12 capitais-sede
da Copa do Mundo. "Estamos prontos para protocolar 12 pedidos de informação
sobre toda a situação de infraestrutura e dos recursos utilizados nas obras da
Copa. É preciso ter uma ação de acompanhamento dessas obras, faz um ano que
tentamos e até hoje não conseguimos sistematizaras informações", diz.
Segundo ele, a iniciativa será uma prova para testar a nova lei e uma
oportunidade para dar mais transparência aos processos relacionados ao evento
esportivo. "Queremos essas informações, saber onde elas estão e qual a
capacidade de transparência do poder público. Aí vamos analisar os dados e
podemos criar um ranking de transparência municipal."
No setor produtivo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) também está
atenta à nova legislação e tem perguntas para fazer, principalmente à
administração federal. Segundo Pablo Silva Cesário, gerente da unidade de
relacionamento com o Poder Executivo da CNI, o país está estreando um novo
formato de avaliação e monitoramento das políticas públicas. "Teremos um pacote,
que ainda não está fechado porque é um leque grande de assuntos. Vamos buscar
informação sobre execução de obras públicas, formação das taxas do Siscomex
[sistema integrado de dados sobre comércio exterior ligado à Receita Federal] e
várias outras sobre os fundos setoriais do setor produtivo, como o de inovação.
A arrecadação desse fundo está correta? Está indo para o lugar certo? Não é
trivial saber isso", comenta Cesário.
A lista de demandas do Movimento dos Trabalhadores Sem
Terra é extensa, abrange várias áreas do governo federal e não aborda
apenas temas ligados à reforma agrária. O movimento social quer saber do Tesouro
Nacional quem é cada um dos proprietários de títulos da dívida pública
brasileira, o valor do título, a data da compra e os rendimentos por mês. Para o
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, será solicitado o registro
de cada uma das famílias assentadas, com nomes por assentamento, data da criação
do projeto dos lotes e detalhamento (via desapropriação, compra, terra pública
ou regularização fundiária), e também será cobrada uma lista das propriedades
com mais de 1.000 hectares, com tamanho da área, local e nome do
proprietário.
Entre as demandas dos sem-terra também está a relação de empréstimos do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a empresas do
agronegócio, com especificações referentes ao valor da operação, data do
empréstimo, condições, taxa de juros e prazo para o pagamento.
Rafael Custódio, coordenador do programa de justiça da Conectas, conta que a
ONG de direitos humanos também pedirá hoje ao governo paulista detalhamento
sobre o sistema prisional do Estado. "Queremos saber quais são as condições de
higiene e saúde principalmente das mulheres presas. Há um déficit de dados que
inviabiliza uma profunda e firme discussão sobre o tema, já que o quadro que se
pinta daquele cenário é borrado, quando não incompleto". A Conectas ainda vai
solicitar ao Itamaraty a divulgação de um relatório da Organização das Nações
Unidas (ONU) que aborda questões de tortura e maus-tratos em cadeias e unidades
de saúde mental de internação forçada.
Fabiano Angélico, jornalista especializado em transparência pública, explica
que a Lei de Acesso à Informação terá vários níveis de implementação até se
alcançar um nível razoável de sistematização de dados, o que "depende muito" da
publicação do decreto que detalha o funcionamento da legislação. O especialista
vê problemas na implementação da regra em Estados e municípios e também lembra
que o governo federal está melhor preparado por ter um órgão como a
Controladoria Geral da União (CGU) envolvendo as outras áreas da
administração.
"A lei é clara: a transparência é regra, sigilo é exceção. Além de questões
de sigilo e risco comerciais, todo o resto é informação potencialmente pública.
Mas pelo que eu tenho acompanhado não é um assunto muito popular. Jornalistas e
entidades mais organizadas têm mais contato com isso, uma lógica que mudará
pouco a pouco quando as pessoas e empresas perceberem que o potencial da lei",
diz Angélico.
Em seminário na Fundação Getulio Vargas (FGV) que discutiu a nova lei,
Francisco Bernardes Costa Filho, da Procter & Gamble, disse que a lei é útil
para a obtenção e organização de informações que possam subsidiar o planejamento
e a decisão de investimento de empresas. Valter Pedrosa, da Braskem, comentou
sobre a pressão que o setor privado terá para melhorar suas práticas
institucionais. "É um novo mecanismo de controle social que vai envolver também
as empresas com relação com o poder público, por isso elas têm que fortalecer
cada vez mais áreas de responsabilidade
social.
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