NOTA PÚBLICA
Processo contra o extinto Banco de
Desenvolvimento do Estado de Goiás
expulsa famílias de agricultores em Santa Cruz de Goiás
A
Coordenação Nacional da
Comissão Pastoral da Terra, ao tomar conhecimento dos fatos que abaixo
descreve, diante da forma como são tratadas as famílias de
pequenos agricultores e pela total parcialidade da Justiça, vem
manifestar à opinião pública nacional sua
indignação.
No dia 6 de março, as famílias
da área Fazenda Vala do Rio do Peixe, município de Santa Cruz de Goiás, foram surpreendidas com a presença de um oficial
de justiça, que vinha cumprir um Mandado de Imissão de Posse, emitido pelo juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual,
contra o Banco de Desenvolvimento do Estado de Goiás. Em nenhum documento os nomes das famílias eram citados.
O
oficial de justiça chegou ao local
acompanhado de 12 policiais, em uma viatura da polícia e em caminhonetes
de luxo. Além deles, estava presente o Sr. Flávio
Canhedo, que representava os interesses do grupo Roma Empreendimentos e
Turismo Ltda, da deputada Magda Mofatto, que pretende a área.
Na
ocasião, o oficial de justiça
e os policiais pressionaram os posseiros para que deixassem suas
propriedades num prazo de 24 horas, dizendo ainda que o Sr. Flávio era
bondoso, pois deixaria que eles retirassem seus pertences e suas
criações. Enquanto as famílias eram notificadas, um
helicóptero sobrevoava a área, agravando o clima de tensão e humilhação
ocasionado pela ação. O Sr.
Flávio mantinha, além de todo o policiamento, quatro seguranças armados
ao seu redor.
No dia 9 de março, eles retornaram
à área e ameaçaram as famílias de que se não deixassem o local, seus bens seriam colocados em caminhões e
seriam leiloados. Um grupo de famílias, porém, resistiu e se reuniu em uma casa, com presença da imprensa e de representantes da
Federação dos Trabalhadores da Agricultura no Estado de Goiás (Fetaeg). Então, o tom mudou e as ameaças se
transformaram em uma proposta de reunião para se decidir o tempo que os posseiros ainda poderiam ficar no local.
Entenda o caso
Do lado dos pequenos agricultores:
A Fazenda Vala do Rio do Peixe é uma propriedade do Estado de
Goiás, de 250 alqueires, em torno a 1.250 hectares. Há
cerca de 15 anos, a terra começou a ser ocupada por famílias, que dela
tiraram seu sustento, fruto de muito trabalho. Em 2003, foi
lavrado no Cartório de Pires do Rio (GO) a Escritura Pública de
Declaração de Ocupação do Imóvel
Rural. Em junho do ano seguinte, a Agência Goiana de Desenvolvimento
Rural e Fundiário, Agência Rural, demarcou os 25 lotes da
área, elaborando e entregando a cada família o respectivo mapa. Em 2006,
a CELG estendeu a linha de energia a todas as propriedades.
Do lado da pretendente da
área: Quem pretende a área é o grupo Roma Empreendimentos e Turismo Ltda., que segundo seu site, atua no setor
Hoteleiro, de Viagens, Construção, Mineração e Imobiliário, na região das Águas Quentes de
Goiás e é o maior e o melhor grupo hoteleiro do Estado. O grupo começou a ser formado em 1972 por Magda Mofatto Hon.
A proprietária atualmente é
deputada federal pelo PTB de Goiás, e só tomou posse após a decisão do STF de não considerar válida a Lei da
Ficha Limpa para as eleições de 2010. Ela também já foi prefeita de Caldas Novas. Iniciou seu mandato em 2004 e em 2006 a
Justiça Eleitoral a afastou, sob denúncia de compra de votos. Conseguiu na justiça retornar ao cargo e governou por mais um ano,
quando foi cassada.
O
Roma Empreendimentos e Turismo tinha uma
pendência jurídica com o Banco de Desenvolvimento do Estado de Goiás
(hoje inexistente) desde os anos 1990. Esta pendência
foi resolvida pela sentença do juiz Dr. Ari Ferreira de Queiroz, da 3ª
Vara da Fazenda Pública Estadual, que no final de 2011 deu
ganho de causa ao grupo, estabelecendo que o Estado deveria pagar à ele
em torno de R$ 50 milhões. Ao que tudo indica, a pretendente
propôs receber em áreas de propriedade do Estado (duas em Goiás e uma no
Tocantins) o valor a que tinha direito, o que foi aceito
pelo Juiz. Este emitiu Mandado de Imissão de Posse e determinou sua
execução via Carta Precatória ao Juiz da Comarca de
Santa Cruz de Goiás, para o caso da Fazenda Vala do Rio do Peixe. Outra
carta precatória foi emitida para o Tocantins, para a
Imissão de Posse da Fazenda Água Preta, no município de Santa Terezinha
do Tocantins.
As famílias de Santa Cruz de
Goiás contrataram um advogado que entrou, no dia 12 de março, com um processo de embargo de terceiros e com pedido de liminar de
manutenção de posse. No dia 15, o mesmo juiz Dr. Ari, rejeitou o pedido, alegando “ausência de efetiva posse dos
imóveis, pois nem sequer moram neles, aquisições recentes e perda de prazo de cinco dias”, e determina a continuidade do
processo de desocupação. Este despacho se baseia em fotografias e relatos resumidos da parte interessada em ter a área.
Diante desta situação, a CPT
denuncia, em primeiro lugar, a omissão do Estado de Goiás que muitas vezes garantiu às famílias a
regularização definitiva dos seus lotes e nunca o fez. Agora empurra as famílias a um confronto direto e desleal com o capital.
Não se têm notícias de sua intervenção para buscar uma solução deste caso de acordo com preceitos da
Justiça Social.
Em segundo lugar denuncia o juiz, que numa
ação contra o Banco de Desenvolvimento Econômico do Estado de Goiás aceita que alegada dívida seja paga com uma
área, sem averiguação prévia, já ocupada e trabalhada há anos por famílias simples e honestas que
delas tiram seu sustento.
Também
ressalta a nula imparcialidade
do juiz que aceita provas da parte interessada como verdadeiras,
afirmando que os agricultores sequer moram nos imóveis, quando a
sentença lhes foi entregue em seus lotes e ainda alega perda de prazo de
recurso, quando as famílias só tomaram conhecimento
desta ação ao serem surpreendidas pela presença do oficial de justiça
acompanhado pela polícia.
Mais uma vez fica claro de que lado a
Justiça se posiciona quando se faz acompanhar na execução da sentença da parte interessada, inclusive com
utilização de seus veículos.
Todo este processo se insere numa nebulosa em
que quem dispõe do poder econômico se faz ressarcir de alegados prejuízos que devem ser pagos por toda a sociedade através
do Estado. O que se sente ao ver uma decisão como essas é que estão em jogo interesses não muito explícitos e que
mereceria passar pelo crivo do Conselho Nacional de Justiça.
Goiânia, 20 de março de 2012.
Coordenação Nacional da
CPT
Maiores informações:
Isolete Wichinieski (Coordenação Nacional da CPT) -
(62) 4008-6400
Adilson Alves da Silva - (62) 3223-5724 / (62) 9979-5216